Carta de Hölderlin a sua Diotima

A Susette Gontard

Todos os dias tenho que voltar a chamar a divindade desaparecida. Quando penso nos grandes homens de grandes épocas, de que modo propagavam um fogo sagrado ao seu redor, a todo morto, a todo seco, eram a praia do mundo, se convertiam em chamas que alçavam com eles o vôo até os Céus, e logo penso em mim, e como vou vagando como uma débil lâmpada e sinto desejos de mendigar por uma gota de azeite para seguir iluminando ainda algum tempo na noite...Olhe! Nesses momentos um prodigioso calafrio me corre todos os membros do corpo, e tênue digo a terrível palavra: morto vivente!

Sabes onde reside a causa por que todos os homens temam entre si? Reside em que o gênio de um consome o do outro para si, alegram-se na comida e na bebida, mas não lhes alegra nada do que alimenta a alma e não podem suportar que algo que dizem ou fazem seja interpretado por outro com espírito. Nécios! Como se algo que pudessem comunicar entre si fosse mais do que essa conversa comum, e só quando se inflama um fogo espiritual, volta a se tornar chama de um modo que também se originou a partir de vida e fogo. Assim se alegram mutuamente do recíproco alimento, ambos vivem e luzem e nenhum consome um ao outro.

Recordas de nossas horas não perturbadas, as horas em que estamos somente unidos um ao outro? Aquilo era o triunfo! Ambos tão livres e orgulhosos e deslumbrantes de alma, de coração, olhos e rosto, e ambos naquela paz celestial, um junto ao outro! E te pressenti naquele momento e disse: seria perfeitamente possível recorrer ao mundo e dificilmente se encontraria algo semelhante. E sinto isso mais forte a cada dia.

Ontem pela tarde vindo de Muhrbeck, para casa. “ Os franceses voltaram a serem vencidos na Itália”, disse. “Enquanto estiver tudo bem conosco, estará bem para o mundo inteiro”... E você me pegou pelo pescoço e nos beijamos nas almas profundamente comovidas e felizes, e nossos olhos inundados se encontraram. Depois, caminhamos. Eu ainda guardo aqueles momentos... será que isso pode substituir um mundo? É isso que faz minha eterna felicidade.

Seu,

Friz