de Martin Heidegger
Tradução: Manuela
Santos
Jovem: Enquanto marchávamos para
nosso lugar de trabalho nesta manhã, enquanto ouvia o ruído da ampla floresta,
fui repentinamente dominado por algo curador [Heilsames]. Por todo o dia
meditei onde e em que este algo que cura poderia repousar.
Velho: Talvez isto seja o
inesgotável – a amplidão que se oculta – que habita estas florestas da Rússia.
J: Você provavelmente quer dizer
que o vasto, que prevalece na amplidão, nos traz algo libertador.
V: Eu não penso apenas no vasto da
amplidão, mas penso também que esta amplidão nos conduz para fora e para trás.
J: O vasto da floresta oscila em
uma distância velada, mas ao mesmo tempo oscila voltado para nós sem findar em nós.
V: É quase como se, da aberta e
ao mesmo tempo velada amplidão, algo nunca pudesse quebrar o que se coloca no caminho da nossa essência e bloquear o seu curso.
Então nada é encontrado do que dobra nossa essência sobre si mesma e a confina
em uma estreiteza, através da qual ela se torna rebelde a si mesma.
J: A amplidão
nos carrega para o que é sem objeto, e não obstante nos preserva de antemão
de nos dissolver nisto. Ela entrega nossa essência ao aberto e ao mesmo
tempo reúne-a ao simples, como se a duração da amplidão fosse a pura chegada na
qual somos admitidos [Einlaβ].
V: Tal amplidão brinda-nos
com a liberdade. Ela nos liberta, enquanto aqui entre os muros deste quartel,
atrás de arame farpado, incessantemente corremos contra o objetivo e nos
chocamos com o que nos fere.
J: No início
desta manhã, eu de fato também pensei que essa experiência do que cura veio
apenas como um sentimento de contraste à doentia estreiteza do nosso campo,
como se não fosse nada além da aparência transitória de uma benção, que por um
curto tempo é conferida a tais enganos. Todavia desde cedo nesta manhã, esta
amplidão tem habitado a minha volta aliviando, apontando, congregando assim
tanto que eu não mais consigo pretender que é apenas um mero engano.
V: A amplidão
curadora não é algo da floresta, mas ao contrario, a amplidão da floresta é admitida [eingelassen] no que cura.
J: Mas também a
floresta não se torna um mero símbolo da amplidão curadora; é provavelmente
algo outro que o mero ocasionamento do seu aparecimento, embora o enigma do
ocasionar já baste para dar o que pensar, e assim nos preservar de esclarecer
tais experiências de modo demasiadamente apressado a partir da sua compreensão comum.
Certamente, não posso dizer do que experimentei a não ser na visão do que a
floresta ocasionou.
V: E, contudo,
você presumivelmente será capaz de apontar algum sinal no qual o que cura se testemunhou
a você. Mas não quero pressioná-lo, pois que sei o quão rigorosamente você
enterra em seu silêncio todas as adversidades que nos tem acontecido nestes
últimos meses. Todavia, para que compreendamos o que se tornou curador pra
você, teremos que saber o que o feriu primeiro. E o que não está ferido e
dilacerado em nós? Nós a quem um cego desencaminhar de nosso povo é tão
deplorável que não permite um lamento, apesar da devastação que cobre nosso solo
nativo e seus homens perplexos.
J: Mas você ainda
está pensando na nossa decisão sobre a marcha para a prisão, a decisão de não
falar mais sobre esta devastação por um longo tempo. Sempre que pode se tornar
inevitável falar sobre isso, contudo, tal conversa deve tomar lugar somente de
maneira recolhida, de acordo com os mais altos critérios, e sem falsa paixão.
Afinal a devastação que estamos pensando não tem existido apenas desde ontem. E
não se esgota pelo que é visível e tangível. E não pode também nunca ser contabilizada por
nenhuma enumeração de instâncias de destruição e eliminação de vidas humanas,
como se a devastação fosse apenas um resultado disto.
V: Porque a essência
da devastação é mais profunda e vem de mais distante, nossa reflexão retorna a ela
reiteradamente. E ao fazê-lo, nós talvez reconheceremos mais claramente que a
devastação da Terra e a aniquilação da essência humana que acompanha àquela,
são de alguma forma o mal [das Böse]
ele mesmo.
J: Por
“mal” claro, não queremos dizer sobre o que é moralmente mau, ou o que é
repreensível, mas sim, o maligno.
V: Mas então, se pensarmos claramente, deveremos
dizer que o mal é o maligno? Ou, como o nome diz: o maligno [das Bösartige] é da forma [Art] do mal [Bösen] e é escoado deste aqui mesmo.
J: Mas desde que não signifiquemos o nome “maligno”
enquanto algo moralmente repreensível, então a sentença, o mal é o maligno deve
ter um sentido, assumindo-se que pensemos o maligno de outra perspectiva que a
da moralidade [dem Sittlichen].
V: De onde devemos pensá-lo, em
caso contrário?
J: Precisamente no sentido daquilo a que a palavra
“maligno” [“bösartig”] se nos refere.
A malignidade é o turbulento [Aufrührerische],
que repousa no furor [Grimmigen], de
tal modo que este furor, em certo sentido, oculta sua ira [Ingrimm], mas ao mesmo tempo sempre ameaça com isto. A essência do
mal é a ira da turbulência [Aufruhrs]
que nunca irrompe inteiramente, e que quando irrompe, ainda se dissimula a si
mesmo, e em sua ameaça oculta é sempre como se não fosse.
V: Então
dizer que o mal seja o maligno pode ter um sentido profundo.
J: O furor que essencialmente repousa no mal solta
a turbulância e o tumulto que pressentimos sempre de todos os lados, onde
encontramos uma dissolução que parece ser imparável.
V: Se,
contudo, o mal repousa no maligno – que é em si mesmo enfurecido por seu próprio
furor, e através dele sempre mais furioso – então eu quase poderia pensar que o
maligno é algo pertencente à vontade.
J: Talvez no todo, a vontade ela mesma seja o que
é o mal.
V: Eu recuso de até mesmo supor algo tão audacioso.
J: Mas eu disse apenas “talvez”, e o que eu disse
tambem não é meu pensamento, mesmo que ele não tenha me soltado desde que o
escutei. Em tal ocasião, esse pensamento foi expresso apenas enquanto uma
suposição.
V: A referência ao mal me ajudou ver um pouco mais
claro o que dissemos sobre a devastação, sobre tudo no que diz respeito ao como
nós podemos encontrar a devastação – digo, como nós de modo algum somos capazes
de encontrar.
J: O que voce está pensando, não está claro pra
mim.
V: A devastação que temos em mente, e que
certamente precisamos começar a pensá-la mais rigorosamente, não é mal no
sentido de uma maldade moral de seu autor alegado. Mas, o mal ele mesmo,
enquanto o malígno, é devastador. Por isso uma indignação moral, mesmo que faça
do público geral seu porta-voz, não é capaz de fazer nada contra a devastação.
J: E porque não?
V: Porque a superioridade moral não está em
condições de compreender, muito menos de abolir ou até abrandar o mal.
J: Pois poderia ser o caso que até a moral [die Moral], por si mesma, junto com
todas as peculiares tentativas de visionar uma ordem mundial e tornar certa a
segurança mundial para os povos através dela, fossem apenas monstruosas descendências
do mal; assim como o sempre muito apelado público mundial, em sua essência e em
sua maneira de emergir, presumivelmente permanece um produto do processo ao
qual estamos chamando de devastação.
V: Na verdade eu não vejo totalmente estas
interconexões. Parece-me que algo similar concernente à origem da moral foi já
dito por Nietzsche.
J: E você
também sabe da suspeita de sua metafísica que vive em nós. Nietzsche, claro,
interpretou a moral – e isso quer dizer, a ética doutrinária
platonico-aristotélica [Sittenlehre]
juntamente com suas formas secularizadas tardias, por exemplo, a ética racional
do Iluminismo e do socialismo – enquanto aparência da vontade de poder. Ele
situou seu proprio pensamento em um “além do bem e do mal”. Mas Nietzsche não
reconheceu que este “além” [“Jenseits”]
– enquanto o reino da pura vontade de poder, isto é, de uma vontade para o
poder que veio a si mesma – teria que permanecer só o mundo contrário do mundo
pensado platonicamente. Mas essa doutrina de “disciplina e reprodução” é apenas
a afirmação extrema da moral. Presumindo, contudo, que a vontade ela mesma é o
que é mal, então o reino da pura vontade de poder é menos ainda um “além do bem
e do mal” – se é que pode se dar algo assim como um “além do mal”.
V: Vejo que foi sem cuidado que mencionei o nome
de Nietzsche. Nós temos certamente negligenciado o fato que um pensamento sobre a filosofia de
Nietzsche deveria ser apenas expresso com o mais alto grau de rigor e a partir de
uma visão riquíssima na totalidade do pensamento ocidental. Contra sua
filosofia, a indignação moral e a arrogância são capazes de tão pouco quanto são
para o processo da devastação.
J: E esta devastação, afinal, concerne a nossa
própria essência e seu mundo, de tal maneira que apenas estamos começando a
pressentir.
V: Contudo, eu também sinto que é necessário que
eu repita o que diz respeito a esta devastação reiteradamente, mesmo que uma
vontade contrária de uma aversão [Widerwille]
possa parar-me de fazê-lo, me pressionando a procurar uma opinião superior,
numa atitude que não mais atenta para a devastação.
J: Mas enquanto nos deixarmos ser levados por uma
vontade de aversão, estaremos valorando moralmente a devastação.
V: E não estaremos verdadeiramente livres no meio
de sua essência.
J: Que somos primeiramente capazes de fazer quando
somos verdadeiramente capazes de pensá-la.
V: Então você quer dizer, que devemos primeiro ser
agraciados com o privilégio deste pensamento.
J: Talvez nós dois estejamos aqui neste campo,
envolvidos em tal diálogo, para que possamos receber este privilégio. Nós concordamos ja desde cedo sobre o
pensamento de que a devastação seja provavelmente um acontecimento [Ereignis] de muito mais longo alcance, pelo
que, finalmente, todas as possibilidades de que algo essencial se erga e
floresça em seu domínio são sufocadas na raíz.
V: E aquilo que sufoca, esconde a si mesmo atrás
de algo traiçoeiro, algo que se anuncia na forma de supostos melhores ideiais
para a humanidade: o progresso, a escalada desenfreada da realização em todas as
áreas da criação, oportunidades de empregos iguais para todos e, sobretudo, o
maior determinante alegado – a padronização do bem-estar de todos os
trabalhadores.
J: O que é
realmente devastador, e isto significa o que é mal. E aqui consiste o fato de
que essas metas para a humanidade acabam levando os vários domínios da
humanidade a se tornarem obsecados em devotar tudo a tal execução, e assim levando incondicionalmente a
devastação avante porquanto cada vez mais reforça a esta em suas próprias
conseqüências.
V: Uma vez nós dizíamos – foi numa velha vila onde
a tropa de prisioneiros estava descansando – que esta devastação não é de forma
alguma uma conseqüência da II Guerra Mundial, mas ao contrário, a guerra é por
sua vez apenas uma conseqüêcia da devastação que vem corroendo a Terra por
séculos.
J:
Portanto, homens isolados ou bandos – que certamente devem instigar e
sustentar as conseqüências deste fenômeno da devastação, mas nunca são a
devastação ela mesma – podem sempre ser apenas de uma classe inferior. Eles são os furiosos funcionários de sua própria mediocridade, que está em
classe muito inferior ao pequeno e miserável que ficam verdadeiramente dentro
de seus limites.
V: “Devastação” [“Verwüstung”] significa pra nós, afinal, que tudo – o mundo, o homem
e Terra – converte-se em um deserto [Wüste].
J: Embora este deserto não surja primeiramente pouco
a pouco enquanto um resultado da propagação da devastação. O deserto já está
previamente aí, e quero dizer como num abrir e fechar de olhos [in einem Nu], para que assim possa puxar
tudo para si, e isto significa ao mesmo tempo, para desertar [ver-wüsten].
V: E então o que é
o deserto? Com este nome, nós associamos à ideia de um lugar sem água,
arenoso, plano num processo de sempre se tornar areia, mesmo que alguem tambem
fale de “um deserto com água” como o oceano, o que significa que sua superficie
imensurável é um plano sem vida.
J: O deserto é o ermo [die Öde]: a expansão abandonada [verlassene] pelo abandono [Verlassenheit]
de toda vida. E este abandono se extende a tais abismos que o ermo não permite
que nada que emerja [aufgeht] de e
por si mesmo, em sua emergência, se desdobre a si mesmo, e neste desdobrar-se
chame outros a um co-emergir. A desolação [Verödung]
se estende para tão longe que nem mais permite nenhum perecer.
V: Nós então estamos transferindo a idéia
georgráfica de um deserto, por exemplo, o Sahara, para o processo de desolação
da Terra e do existir humano [menschlichen
Daseins].
J: É o que parece. Mas me parece, contudo, que o
conceito geográfico de deserto não é uma idéia suficientemente pensada da
desolação, que se aproxima e vem à nossa visão somente em circunstâncias e
condições particulares da superfície terrestre.
V: Nós pensamos, portanto, o deserto enquanto a amplidão
abandonada [verlassene] pelo abandono
[verlassenheit] de toda vida. O
deserto é propriamente o devastador. Por isso a devastação consiste em que tudo
– mundo, homem, e Terra – entre no abandono da vida.
J: Aqui
pensamos a palavra “vida” – como sempre tem sido desde tempos antigos no
pensamento ocidental – de modo tão lato que a sua esfera de significação
coincide com aquela da palavra Ser.
V: Mas agora, na medida em que a devastação
consiste no abandono pelo Ser, então, pois, ela não mais permite nenhum ente, e
isto assim ao ponto que finalmente tal falta possa lhe dizer respeito. Ou
devemos chamar a uma era histórica em que uma forma de “vida” ainda assim
domina, “a era da devastação’?
J: Se nós pudessémos ou até mesmo devêssemos isto,
então, mundo, homem e Terra podem ser – e podem, contudo, tendo entrado na
devastação – permanecer abandonados pelo Ser.
V: O Ser de uma era de devastação consistiria precisamente
no abandono pelo Ser. Tal matéria é, contudo, difícil de pensar.
J: Em todo
caso, por agora é difícil para o homem contemporâneo, que raramente pensa no
fato de que por trás da aparência de uma vida mais segura, mais elevada, um desleixo,
se não certamente um impedimento, da vida poder se dar.
V: Se damos espaço a este pensamento, devemos, com
efeito, pensar que o Ser de tudo o que é, mantem-se ambíguo no cerne.
J: Sem podermos, de imediato, experimentar onde se
funda esta ambigüidade e se com esta caracterização do Ser é dito o mínimo dele
mesmo. Presumivelmente estamos falando aqui apenas de um embaraço da
compreensão humana [menchlichen Deutens]
ao reportar-se ao Ser, mas não do Ser ele mesmo. É enigmático.
V: E ainda
mais misterioso do que a compreensão corrente supõe entender, a qual justamente
avalia a História e as eras históricas apressadamente de acordo com apogeus e
ocasos, e calcula todo o fenomeno histórico nos termos do que é desejável e não
desejável.
J: Este tipo de calcular histórico poderia até ser
uma conseqüência do fato de que o homem está devastado em sua essência, o que
agora significa pra nós, abandonado pelo Ser.
V: E que ele, assim abandonado, contudo é, mas de tal maneira que todo o fazer e
ter ele rola com o nada.
J: Com isso você está dizendo concisamente que o
niilismo apenas pode ser algo historicamente positivo quando algo como um
abandono do ente pelo Ser acontece, um abandono que, contudo, ainda deixa ser o
ente.
V: Nietzsche na verdade avistou as aparências do
niilismo; mas ele não conseguiu conceber a sua essência.
J: Porque ele, na verdade, finalmente ainda não
podia pensar esta essência a partir de fundamentos essenciais.
V: Eis porque o seu próprio pensamento permanece
preso ao niilismo.
J: E isto de modo tão definitivo, que a metafísica
de Nietzsche apenas prepara a consumação do niilismo ao incondicional.
V: E daí mesmo ela concerne ao processo da
devastação.
J: O maligno dessa devastação alcança o extremo
quando se estabelece na aparência de um estado seguro do mundo, para que se
possa garantir ao homem um padrão
satisfatório de vida enquanto a meta mais alta do existir [Daseins] e garantir sua realização.
V: O processo de devastação então não será
repelido, menos ainda findado, com a criação de uma ordem moral mundial
fundamentada.
J: Porque aqui
as “medidas” [“MaBnahmen”] humanas
– ainda que seja gigante a sua extensão [AusmaB]
– não são capazes de nada. Pois o maligno, enquanto o qual a devastação se dá,
pode muito bem permanecer o traço básico do Ser ele mesmo.
V: Se, com
efeito, a devastação repousa no abandono do ente pelo Ser, e se esse abandono
vem do Ser ele mesmo. Mas você tambem não acha que este pensamento – que o Ser seja
[também] no fundo de sua essência maligno – é uma exigência horrível ao pensar
humano?
J: Certamente, e especialmente quando o pensar deveria tambem abster-se do pensamento
de que o mal mora na essencia do Ser, enquanto “pessimista”ou valorá-lo de
alguma forma.
V: Tudo isso, é claro, não é fácil.
J: Que isto, a saber, o pensar o que é essencial, seja
supostamente fácil é também uma exigência que vem somente do espírito da
devastação.
V: Porque a devastação, na medida em que provém do
Ser, é um acontecimento mundial que sitia a Terra, e os homens talvez nunca
presumam ou ajuízem sobre isso. Pois não é só o limite do opinar diário entre
os homens e grupos que é sempre restrito, mas também o é o homem que ajuíza
muito rapidamente e facilmente cai sempre numa discussão barulhenta que o
corroe; e este homem se torna um escravo de sua própria fúria, a ponto que não
mais pode ver para além da fachada que apressadamente ele construiu à sua
volta.
J: E desde que suficiente desgraça foi nos dada a
suportar, nós mesmos gostaríamos de manter o coração e o espírito livres da
aura perturbadora exalada pelo pensamento mau humorado. Quanto mais essencial é
um discernimento, maior também deve ser o tato com o qual ele acorda os
companheiros para o saber que cresce dele.
V: Eu não
entendo completamente porque você agora salienta precisamente isto.
J: Porque um dia, de um discernimento mais claro
da essência da devastação, nós reconheceremos que a devastação reina também
certamente e precisamente lá, onde países e povos não foram atingidos pela
destruição da guerra.
V: Onde, portanto, o mundo resplandece no brilho do
avanço, das vantagens, da fortuna, onde os direitos humanos são respeitados,
onde a ordem civil é mantida e, sobretudo, onde todo o abastecimento e
fornecimento para saciar o contínuo contentamento é assegurado, de modo que tudo permanece visto de fora e
arranjado e contabilizado para que seja útil.
J: Onde, sobretudo, o desnecessário nunca impede a
rotina diária e traz as temidas horas vazias, nas quais o homem se torna
entediado.
V: Como é, contudo, que lá, o que dissemos sobre a
devastação da Terra é o que supostamente domina – e certamente até o mais alto
grau – isso é que é difícil de experenciar, e mais ainda de pensar. Mas o que
será mais dificil é mostar, sem arrogância, a devastação para aqueles que são
afetados e, sem o menor traço de paternalismo, dar a eles conselhos para a
longa recordação que é exigida, para que se possa tornar familiarizado com a
devastação enquanto um acontecimento que permanece fora de toda culpa e
expiação humanas.
J: Portanto nós tambem nunca – meramente no
sentido de apenas ouvir a notícia de que a devastação é só uma questão do
destino [Schicksal] – devemos cair
vítimas da óbvia tentação de passar por cima dela; especialmente na medida em que
nós estamos nos guardando, sobretudo, contra a tentação de passar por cima de
algo.
V: Nós preferiríamos aprender a simplesmente
esperar até que nossa própria essência se torne nobre e livre o bastante para consentir
com decoro [schicklich] ao mistério deste Desitino [Geschickes].
J:
Simplesmente esperar, como se esse consentir consistisse na espera; e
esperar por tanto tempo, como se esse esperar
tivesse que durar mais que a morte.
V: A morte ela mesma é algo que nos espera.
J: Como se ela esperasse por nosso esperar.
V: E pelo que esperamos?
J: Deveríamos perguntar antes se esperamos
propriamente?
V: Na medida em que esperamos por algo [auf etwas warten], atribuímo-nos a um
esperado. Nosso esperar [Warten] é
então apenas uma expectativa [Erwarten].
O puro esperar é perturbado – porque no puro esperar, ao que me parece, nós
esperamos por nada.
J: Se nós esperamos propriamente pelo Nada, então
nós já caímos de novo na expectativa, que neste caso se apega ao fato de nada
ser nunca expectado. Equanto esperamos por nada de um tal modo, não esperamos
puramente.
V: O quão estranho é isso, o esperar que deve ser
nem por nada nem por algo, e contudo, esperar.
J: Na verdade, esperar o que corresponde à pura
espera. Dito mais adequadamente: esperar ao que responde à pura espera.
V: Você fala de um esperar, e pensa na espera como
que um resguardar e manter, de modo que a questão permanece – o que entao
significa “esperar”, se ele não pode ser equiparado com o resguardar?
J: Desde hoje de manhã cedo eu agora sou capaz de
dizê-lo: esperar é o deixar-vir.
V: Deixar o que vir?
J: No puro esperar, o que mais deixamos vir do que
o vir?
V: Então não algo que vem – mesmo se na espera,
nós também, mas secundariamente, pensamos no vir do que vem.
J: Não; aquilo que nós pensamos, em deixar vir, é
o vir. Pensar no vir [An das Kommen
denken] – este é um enigmático recordar [Andenken].
V: Se o deixar-vir caracteriza a espera, então esta
é direcionada para o futuro, e assim reverte o recordar, estabelecido que
supomos por recordar primeiro o reportar-se ao passado [Vergangenes].
J: Mas
talvez esta opinião seja arbitrária. Talvez devamos também primeiro considerar
se a pura espera é direcionada para o futuro. Presumivelmente isto é válido
para o expectar. O enigmatico da espera enquanto um recordar repousa naquilo em
que ela não permanece direcionanda nem pra algo futuro nem pra algo passado, e
evidentemente nem também para algo já presente.
V: Nós quase gostaríamos de supor que a espera
alcança – não sei se deveria dizer em
ou fora – uma ainda cerrada dimensão
do tempo.
J: E com isto, enquanto o deixar vir do vir, ela espera
no sentido do resguardar.
V: Mas afinal, nós só podemos resguardar o que já
foi confiado à nossa guarda e, portanto, é presente [Anwesend].
J: E, contudo, isto poderia ser confiado à nós e
ao mesmo tempo ser ainda preservado.
V: Tudo que você diz agora sobre o esperar é tão
simples e ao mesmo tempo tão misterioso, que eu tenho que lhe perguntar, como é
que você pode saber isso com tanta clareza e apenas desde hoje de manhã?
J: Porque na experiência do que vem, e de que ele é o que esperamos, e
de que em tal espera unicamente nossa essência se torna livre; porque na
simples experiência de tudo isso, o que cura se aproxima e nos é doado.
V: Você diz “nós”, quando, contudo, este curador
foi doado só a você.
J: Mas neste mesmo dia, eu gostaria de
compartilhá-lo agora com você, porque há muito eu sinto, com clareza suficiente em nossas conversas,
frequentemente interrompidas durante os intervalos da guerra, em nossas
marchas, e agora aqui neste campo, que lhe dói a mesma ferida.
V: Sem que eu mesmo saiba agora o que está ferido
de modo tão particular em você.
J: Uma vez que me foi concedido experimentar o que
cura, nesta manhã, eu posso também nomear pra você a ferida que está começando
a curar. Durante todos os anos de serviço militar na guerra, seguramente, num
certo sentido prioritáro ao meu estudo na universidade, foi como se minha
essência fosse emparedada e completamente expulsa da livre amplidão do
pensamento. Ao mesmo tempo, contudo, me foi permitido pressentir e aprender a
pressentir este pensamento como um país distante.
V: Quantos de nós, por anos, não teve que perder
sua estada no mundo do pensamento? Quantos tem sido arrebatados para
sempre para fora deste mundo?
J: Penso menos numa renúncia da atividade
intelectual, que na abstinência do existir [Dasein]
que repousa no fundamento do pensamento. A dor ardente é que não nos foi
permitido estar aí para o desnecessário.
V: Fomos barrados desde cedo.
J: Mesmo que nos falassem que poderíamos reclamar
os direitos da juventude, no qual tudo terminava meramente com a inexperiência
de adolescentes desafiando o conhecimento dos mais velhos.
V: E então da noite para o dia, estes adolescentes
foram proclamados “homens”.
J: De tal modo que todos os conceitos e palavras
deram uma virada, porque tudo já surgia do tumulto.
V: A devastação já estava em trabalho antes que a
destruição começasse.
J: Certamente, caso contrário a destruição não
poderia nem começar.
V: E,
contudo, existia entre muitos de nós um tipo genuíno de juventude. Como todo
jovem genuíno, em qualquer tempo, eles podiam pensar para além daqueles que são
mais velhos, se tivessem podido ser justamente jovens.
J: E isto significa, se a eles fosse permitido
esperar puramente. Na verdade, costuma-se dizer que a juventude é impetuosa e
incapaz de esperar. Parece-me, contudo, que tal impetuosidade juvenil para que o
vem, surge somente de uma espera ainda desajeitada em seu primeiro florescer, a
qual os mais velhos deveriam proteger de congelar-se, na medida em que eles deveriam
purificar a espera da juventude, e trazê-la para o caminho, ao invés de
cortá-la pela raíz e falsificá-la em meras expectativas [Erwartungen] e, assim, abusarem dela.
V: A busca
do mero expectar e a ganância de acumular reservas sempre se ligam ao que é
supostamente necessário.
J: Eles
assim tornam cegos os olhos de nossa essência para o desnecessário.
V: E pelo fato de que o desnecessário
permanece em todos os tempos, o que é
mais o
necessário de tudo.
J: Só aquele que aprendeu, a saber, a necessidade
do desnecessário pode apreciar a dor que surge quando o homem é barrado de
pensar.
V: Pensar, portanto, é o desnecessário, e ainda
você atribui ao pensar um alto grau de
honra na essência do homem.
J: Até mesmo o mais alto grau. Você também sabe, é
claro, que a sabedoria ocidental desde tempos antigos pensou o homem enquanto a
essência pensante [das denkende Wesen].
V: Isso, o sei certamente. Mas eu não sei o
fundamento [Grund] disso. E nunca
pude compreender porque esta sabedoria apressadamente transpôs – através de um
processo que, é claro, durou séculos – a essência do pensamento para ratio e para racionalidade [Vernünftigkeit].
J: É como se o Ocidente fosse incapaz de esperar
até que o pensamento achasse o seu próprio caminho para sua essência original,
que talvez consista na pura espera e na capacidade de esperar.
V: Talvez seja também precisamente porque a essência
do pensamento é especialmente vunerável e suscetível à toda precipitação.
J: Pois só podemos experenciar a pura espera e
preservar nossa essência nela, esperando. Querer dominar a pura espera
apressadamente seria como colher água com uma peneira.
V: Nesta oportunidade favorável, quando você está
tão claramente me avisando contra a pressa,
eu gostaria de contar-lhe algo que tem me perturbado por um bom tempo.
Sempre que previamente falamos sobre a determinação ocidental da essencia [Wessenbestimmung] do homem – a cada vez
você focou apenas em uma caracterização do homem enquanto o vivente que pensa. Na
verdade, esta determinação já era comum no mundo Grego. Mas na maioria do mundo
Grego, o pensamento humano foi de outra forma – a saber, enquanto ό θνητός,
enquanto mortal, em distinção aos imortais, os Deuses. Esta caracterização do homem
me parece ser imcomparávelmente mais profunda que a que você primeiro mencionou,
que é adquirida por meio de um ver o homem através de um ver a si mesmo, isolado e separado das
grandes proporções [Verhältnissen]
nas quais ele é [steht] propriamente.
E dentre destas proporções, aquela que ele tem aos deuses tem prioridade sobre
todas as outras.
J: O que é isso que você gostaria de dizer com
esta indicação?
V: Eu gostaria de admitir um receio, a saber, que
você apressa-se pela determinação mais velha e profunda da essência do homem
enquanto a de uma essência mortal, em favor de uma caracterização mais jovem e
rasa do homem a qual concebe-o enquanto essência pensante. Eu acredito que
compreendo também no que essa pressa é fundada.
J: E no que você acha que ela é fundada?
V: Nisto de que a filosofia e a apresentação [Darstellung] histórica de sua história têm
em vista por rotina esta definição do homem enquanto a essência pensante.
Embora tal determinação seja comum entre pensadores, eu devo admitir que não
sei porque é comum. A antiga caracterização do homem enquanto mortal é, em
contrapartida, mais própria [eigen] dos
poetas, o que ainda se pode ver através da poesia de Hölderlin.
J: O que você diz toca algo por respeito ao qual
eu certamente lhe devo uma resposta. Mas agora eu gostaria também de admitir para
você um receio, a saber, de que teremos que sacrificar nosso descanso noturno e
o diálogo começado nesta tarde, se devemos lograr um esclarecimento das duas determinações
da essência do homem e de suas proporções ainda que de modo rudimentar.
V: Não foi minha intenção de repentinamente voltar
nosso diálogo da tarde para as multicamadas [vielschichtige] e, portanto, também ambígua [vieldeutige] questão da essência do homem. Só me pareceu ser uma boa oportunidade de apresentar
para você algo que há muito está em meus pensamentos.
J: Talvez sua questão interina até pertença ao
nosso diálogo. Por isto eu gostaria de responder-lhe em várias perspectivas. E
até certo ponto eu provavelmente serei capaz de fazê-lo, porque eu tenho que
refletir constantemente sobre isto quando penso.
V: Ficarei satisfeito se você me disser sua
postura por relação à determinação mais antiga, e em sua opinião mais profunda,
da essência do homem, que o pensa enquanto o θνητός, o mortal.
J: Sei disso muito bem; mas a determinação mais
antiga pode apenas ser compreendida quando a mais nova for pensada. Eu gostaria
de pôr em dúvida se esta permanece rasa em comparação com a mais antiga. Só a
interpretação corriqueira da determinação da essência do homem enquanto o ζωον
λόγον έχον [zoon lógon écon] me parece rasa. Mas se nós finalmente aprendermos
a pensar que λόγος [lógos]
originalmente significa reunião [Sammlung],
então a determinação do homem por respeito ao λόγος diz que sua essência
consiste no ser- em-reúnião, a saber, sobre o originário Um unificante.
V: Enquanto você diz isso, já está se tornando
mais claro o reportar interno dessa determinação à antiga. Presumivelmente você
de forma alguma se apressa para a antiga definição
em favor da mais nova, mas apenas considerou mais cuidadosamente a nova para
que possa então esperar mais puramente a verdade da outra.
J: Que seja, pois
a mais antiga é, como todo princípio, mais difícil de pensar.
V: Se o homem
enquanto o mortal é experimentado por distinção aos imortais, ele manifestamente
é pensado por respeito aos Deuses e ao Divino.
E se o λόγος significa a reunião sobre o originário Um
todo unificante, Um que, contudo, é o Divino ele mesmo, então as duas determinações
essenciais – que inicialmente aparecem enquanto quase incompatíveis, ou ao menos
enquanto estranha uma da outra – fundamentalmente pensam o Mesmo.
J: Seu
esclarecimento da co-pertença das duas mais antigas determinações ocidentais da
essência do homem é certamente esplêndida, mas me parece apressada a determinação
alegada como a mais antiga, que o homem experimenta em sua mortalidade.
V: Como assim?
J: Na medida em que você toma essa determinação
do homem, a saber, a que ele é um mortal, apenas como uma marca para o que
essencialmente o difere dos imortais. Mas a determinação ό θνητός, que costuma-se traduzir por “mortal”, não concerne tanto à
reportação do homem aos imortais, que é nomeada, mas à reportação à morte: ό θνητός aquele ente que
pode morrer.
V: Mas o animal
também pode morrer, e para tal, a caracterização enquanto θνητός não seria de modo algum um traço distintivo da
essência do homem.
J: Se o traço
distintivo é um tal, então devemos ter em consideração que o animal não pode
morrer. O animal não pode morrer, isto é, se morrer significa: marchar sobre a
morte, ter a morte.
V: Só quem conhece
a morte é capaz dela.
J: Ou quem pode
ao menos saber [wissen] da morte. E
só o pode quem, conforme sua essência, diferente da morte que espera sobre nós,
pode esperar aquilo do que, como a morte, espera a toda nossa essência.
V: O homem é,
enquanto aquele que pode morrer, a essência que espera.
J: Isso é o que
penso.
V: Você pensou
algo muito belo. Contudo, com esta
interpretação da antiga definição da essência do homem, não vejo agora nenhum reportar
a mais nova.
J: E se ainda,
você considerar que no λόγος, enquanto a reunião sobre o originário Um todo unificante,
reina algo assim como uma diligência [Achtsamkeit],
e se você se perguntar se a diligência não é o mesmo que um esperar constante
naquilo que nomeamos o puro vir, então talvez um dia você perceba que, também
na alegada mais nova definição, a essência do homem enquanto aquele que espera
é experimentada. Certamente, essa essência do homem enquanto espera permanece
aqui, como lá, no não-dito. E eu não gostaria de afirmar que o que acabou de
ser dito foi já propriamente [eigens]
pensado pelos antigos – e também eu não
gostaria de decidir qual das duas definições, pensadas em suas verdades, é a
mais antiga. Parece-me que as duas são igualmente antigas, porque igualmente
originárias, em sua essência igualmente oculta. Mas tome o que foi dito apenas
como uma suposição.
V: Você...
J: O que?
V: Estou feliz
que confessei a você meus pensamentos sobre a suposta prioridade da
supostamente mais nova definição da essência do homem.
J: E estou grato por
ter sido capaz de explanar algo a esse respeito. Ontem eu ainda não seria capaz
disso.
V: Porque hoje de
manhã cedo, aquilo que cura foi primeiramente doado a você, aquilo que começa a
lhe curar – que agora experimento também comigo, por nos deixar-ser aqueles que
esperam.
J: Aqueles para
os quais todo distante é próximo na proximidade do resguardo e todo próximo é distante
na distância da boa-querência.
V: E então para
aqueles que esperam, o próximo e o distante são o Mesmo, embora precisamente
para estes a diferença do próximo e do distante se mantenha aberta mais
puramente.
J: Por isso,
aqueles que esperam vão também se guardar contra o imediatismo inquiridor que
pergunta o que é isso que cura em si mesmo. Por todo esse dia, eu ainda senti
urgir essa pergunta. E agora vejo que tal pergunta permanece imprópria àquilo a
que esperamos.
V: Me parece que
aqueles que primeiramente esperam aprendem primeiro a correta modéstia.
J: De modo que
eles possam ser professores da grande pobreza.
V: Aqueles que
sabem o que cura sem pesquisá-lo.
J: O que mais
poderia isto que cura ser, exceto aquilo que deixa nossa essência [Wesen] esperar. No esperar, a essência do
homem [Menschenwesen] é reunida na
diligência sobre isto ao qual ela pertence e sem ser levada a se dissolver
nisto.
V: Mas, contudo,
na espera, enquanto aqueles que esperam, ouvimos de fora no indeterminado e abandonamos
aí, por assim dizer, a nós mesmos. E agora você quer dizer que, na espera e enquanto
aqueles que esperam, estamos antes no caminho que nos guia à nossa própria
essência.
J: A espera é uma
vereda que leva o nosso curso, uma vereda sobre a qual nos tornamos estes que
nós somos, sem já os ser: os que esperam.
V: E então, se um
homem fosse capaz disso, a pura espera seria como um eco do puro vir.
J: Este vir
ocorre essencialmente em todo nosso redor e a todo o momento, mesmo quando não
o consideramos. A espera é a capacidade que ultrapassa [übersteigt] toda nossa atividade [Tatkraft]. Quem se encontra no poder de esperar excede [übertrifft] todo o realizar e os seus êxitos, embora a
espera nunca conte com um tomar a dianteira [Überholen].
V: Isto
justamente não pode ser pensado enquanto algo assim como uma competição.
Enquanto aqueles que esperam, somos a admissão [Einlaβ] para o que vem. Somos de tal modo que, admitindo o vir,
vimos primeiro a nós mesmos, enquanto aqueles que são o que são na medida em
que se abandonam, mas isto devido ao fato que contra-esperam o vir.
J: Na espera nós
somos pura presença [Gegenwart].
V: E nada mais.
Somos isto tão puramente que mais de nenhum lugar algo nos interdita, algo o
qual poderíamos agarrar e do qual ainda desejássemos nos poupar.
J: Esperando
somos de tal modo como se passássemos desapercebidos e anônimos; não [somos]
para tudo que sempre é só expectativa [erwarten]
disto ou daquilo e na expectativa deste ou daquele algo para si. Esperar tem
uma essência outra que toda expectativa, que é fundamentalmente incapaz de
esperar.
V: Esperando nós
também já partimos, a saber, para nossa essência, que foi empregada pelo puro vir,
enquanto a admissão que responde a ele.
J: Enquanto
aqueles que são chamados desta forma, nós somos como um instrumento de cordas
da mais antiga proveniência, nos quais o som do jogo primordial do Mundo ressoa.
V: Por
conseguinte este instrumento está provavelmente também – pense na determinação
da essência do homem a mais antiga – suspenso em segredo decoroso no oculto. De
resto, não é assim quando você diz que nós estaríamos na essência da admissão
que responde ao vir e, portanto, a resposta [Antwort] não é também, como a “presença” [“Gegenwart”], o mesmo que a “resposta” na palavra [Wort]?
J: Sim, contudo
não apenas “também na palavra”, como você diz, mas justo e previamente já na
palavra.
V: Se agora a presença é referida ao tempo, mas referida
à palavra a resposta, então o tempo e a palavra são irmanados intimamente, mais
do que os homens até aqui puderam pressentir.
J: Na medida em
que se tem um fundamento para fazer esta suposição, contudo, nós provavelmente
precisaríamos aprender a pensar a essência do tempo de acordo com que tem sido pensado enquanto a presença, e
pensar a essência da palavra por respeito à resposta.
V: Talvez nós já
estejamos aprendendo isto por sermos aqueles que esperam, isto é, por sermos
aqueles que têm tempo para o longo tempo no qual uma vez a verdade se dá [das Wahre sich ereignet].
J: Aqueles para
os quais a longa duração do que vem nunca se torna entediante.
V: E no que isto
consiste?
J: Presumivelmente isso tem a ver com o fato
que nós – no esperar do vir – já também concedemos a admissão a cada coisa.
V: Para onde? Com
certeza não para nosso interior, pois aí estaríamos nos colocando contra as
coisas, enquanto aqueles que tem o domínio sobre a essência das coisas. De tal
maneira, nós estaríamos tornando coisas em objetos para sujeitos, assumindo para
nós mesmos o papel deste último.
J: Nós, contudo,
precisamente não somos sujeitos e não mais sujeitos, quando nos tornamos àqueles
que esperam. Ao contrário, no esperar, nós liberamos as coisas precisamente
para onde nós, enquanto aqueles que esperam, nos deixamos ir, a saber, para o
que pertencemos.
V: E ao que pertencem
as coisas?
J: Àquilo no qual
elas repousam [beruhen].
V: E no que elas
repousam?
J: No retorno a
elas mesmas.
V: Então quando o
homem põe as coisas para si enquanto objetos, e apenas as deixa ser enquanto
tais e subsistem neste sentido, ele não deixa as coisas serem em seu repousante
repouso [Ruhe].
J: O homem
persegue as coisas numa inquietação que é estrangeira a elas, tornando-as meros
recursos para as suas necessidades e itens em seus cálculos, e apenas meras
oportunidades para o avanço e manutenção de suas manipulações.
V: Por não deixar
as coisas serem em seu repousante repouso, mas, ao contrário – enfeitiçado por
seu próprio progresso – passando por cima e para longe delas, o homem se torna
o precursor da devastação que, já por um longo tempo, tem se tornado a
tumultuada confusão do mundo.
J: Se somos
aqueles que esperam, então nós não temos, por assim dizer, coisas vindo para
nós; desta maneira, nós imediatamente nos transformaríamos naqueles que tem
expectativas, e sempre quereríamos algo das coisas. Somos aqueles que esperam
quando deixamos as coisas retornarem a elas mesmas. De tal retorno a elas
mesmas, elas trazem a própria presença [Gegenwart]
delas mesmas diante [entgegen] de nós;
então antecipadamente, quando esperamos no puro esperar, elas preenchem o vazio
que para nós parece escancarar-se a nossa volta, e não apenas de vez em quando em
uma expectativa do vir.
V: Nós deveríamos,
para dizer com mais propriedade, que as coisas que são desta forma presentes
não permitem o vazio adiante, e então também não há a possibilidade de
preencher tal vazio.
J: O puro vir, no
qual esperamos, também não é algo embaçado e indeterminado. Ele é único e
simples, para o qual homens, contudo, adaptam-se somente devagar, pois somos
raramente capazes de deixar algo Ser naquilo que ele repousa.
V: Mas na medida
em que nos tornamos capazes disto, a saber, de deixar algo ser naquilo que –
enquanto em sua própria essência – é deixado, então somos verdadeiramente
livres. A liberdade repousa no ser capaz de deixar [Lassenkönnen], e não no dispor e no dominar.
J: E unicamente
essa liberdade é a verdadeira superioridade, a qual não precisa ter algo
subjugado a ela, no qual ela suportaria a si mesma para se manter por cima.
V: Talvez a essência
da liberdade, contudo, seja ainda mais misteriosa do que pensamos.
J: Porquanto nós
ainda pensemos nela a partir da dominação e do positivo.
V: E ainda, agora
também estou aprendendo a perceber mais claramente como foi possível aquilo que
liberta ser ocasionado a você pela permanência da amplidão da floresta, e como,
naquilo que liberta, o que é curador poderia se aproximar.
J: Que cura na
medida em que acalma, mas nunca remove a dor.
V: Contudo, como
você mesmo disse, o que era doloroso era que você permanecia barrado de pensar.
Mas me parece agora que o que foi doloroso consistia um tanto no fato de que
você não era mais capaz de saber em que sentido você é alguém que pensa – e
isto significa, depois de tudo que dissemos, aquele que espera. Você já era
alguém que espera quando a ocorrência da devastação o angustiou. Se não
fossemos já em essência aqueles que esperam, então como poderíamos em algum
tempo nos tornar isso?
J: De acordo com
um velho ditado, só nos tornamos o que somos.
V: E de acordo
com um novo ditado, só somos o que procuramos.
J: E só procuramos
aquilo do qual esperamos.
V: E esperamos
naquilo ao qual pertencemos.
J: Mas
pertencemos ao vir enquanto a
presença [Gegenwart], que respondendo
[antwortend], o admite [einläβt].
V: Enquanto tal
presença, deixamo-nos [lassen wir uns] ao vir, porque nossa essência já é deixada
a ele.
J: E então, deixando-nos,
tornamos a nós mesmos pela primeira vez próprios.
V: Cada uma
dessas frases, que chama à outra, diz o Mesmo.
J: E cada uma é
inexprimível [unausdenklich] porque
cada uma pensa com antecedência [vordenkt]
ao vir.
V: O vir é
presumivelmente aquilo frente ao qual, enfim, nada mais pode ser pensado: o
impensável à frente [das Unvordenkliche].
J: Por isso, o
que cura também não pode nunca ser representado [Darstellen] em declarações proposicionais.
V: Mas sim, suposto
ao modo do diálogo, como aconteceu agora conosco.
J: Ou talvez também como eu inicialmente tentei
dizer para mim mesmo, quando, não intencionalmente, estas palavras se disseram
para mim:
Só em espera
Tornamo-nos a nós mesmos próprios,
Concedemos a todas as coisas
O retorno ao repouso.
Como o terno
Som de violinos antigos mestres,
Que passou inaudível
Como instrumentos em baús ocultos.
V: E tenho
constantemente ponderado se o seu pensamento não é de fato um poetar oculto.
J: Você quer
dizer que eu poeto porque expresso agora o que estamos tentando dizer com a
ajuda de versos e rimas.
V: Embora eu não
o ache; sei bem que versos e rimas não atestam o que é poético, e que até
poetas genuínos podem ser presas de seus versos e rimas. Jacob Buckhardt, cujas
cartas várias vezes lemos juntos, uma vez escreveu uma frase que memorizei e
tenho sempre refletido a respeito. Lê-se: “Na verdade há matérias [Sachen] de poetas muito renomados que
são interiormente nulas e vazias, e que só caminham em muletas de rimas”.
J: E ainda agora
falei sobre as rimas.
V: Mas suponho
que o poetar de seu pensamento repousa naquilo que é uma espera, e
fundamentalmente já o era assim, até antes disso se alçar hoje ao claro saber para
você.
J: Talvez aqueles
dentre um Povo [Volk] que poetam e
que pensam não sejam nada mais que aqueles que esperam no modo mais nobre, na
presença ao vir [Gegenwart zum Kommen],
presença através da qual a palavra se
atém à resposta da essência do homem [Menschenwesens]
e assim é trazida à linguagem.
V: E então o povo
de poetas e pensadores seria num sentido singular, o povo que espera.
J: O povo que deve,
só e talvez, esperar ainda um longo tempo pela chegada desta sua essência, de
modo que ele se tornaria mais esperante
do vir, no qual a devastação enquanto algo passado já é preterida.
V: Este povo que
espera, especialmente durante o tempo que sua essência ainda lhe escapa, e justamente
ainda inexperiente desta essência esperante,
conforme isto, estaria em perigo como nenhum outro.
J: E, certamente,
esse povo estaria em perigo não por ameaças de fora, mas na medida em que ele
tiranizasse a si mesmo com sua própria ignorante impaciência, e então se
impulsionasse a erros contínuos.
V: E tudo isso na
opinião que, para seguir sua essência, teria que finalmente ganhar reconhecimento
por parte de outros povos.
J: Enquanto, com
efeito, esta precipitada pseudo-essência permanece perpetuamente uma desastrada
imitação do estrangeiro.
V: Se este povo
se tornar algum dia o povo que espera, então teria que permanecer indiferente se
outros o ouvem ou não.
J: Este povo não
poderia também nunca, porquanto soubesse de sua essência, prevalecer-se de sua essência
esperante como de um chamado especial
e distinto.
V: Ao encontrar
sua pura essência, esse povo não teria mais nenhum tempo para comparar-se com
outros, seja de forma subestimada ou superestimada.
J: O povo que
espera teria até que ser totalmente inutilizável para outros, porque claro o
que sempre apenas espera, e constantemente espera ademais ao vir, não rende
nada de tangível que pudesse ser usado no progresso e na elevação da curva de
realizações, e para a ativa marcha dos negócios.
V: E este povo
inteiramente inutilizável, teria que se tornar o mais velho povo, de modo que
ninguém o aflija e tome em uso o seu fazer solitário, o qual é um deixar, para
utilizar e esgotar prematuramente.
J: Sua fama, se é
que se pode ostentar finalmente semelhante coisa, teria que consistir naquilo
em que poderia esbanjar sua essência unicamente no desnecessário. Pois o que é
mais desnecessário do que o esperar que espera o vir? O que é mais necessário
do que o agarrar sem vacilar ao que está dado, o não criado do subsistente, e o
levar adiante do que tem sido até agora?
V: Portanto,
aquele sentido concreto, o qual dizem que ele deixa o homem primeiramente se
postar em seus dois pés diretamente no chão.
J: Aquele sentido
que nos leva a nos assegurar de um lugar para nós na Terra, um lugar onde
podemos ser firmes e nos criar próximos aos fatos, para que sejamos positivos e
válidos. E ainda, contudo, este necessário [nötiges]
não pode nunca ser sem o desnecessário.
V: De tal modo que a necessidade do
desnecessário [die Notwendigkeit des
Unnötigen] permaneceria para ser pensada.
J: Não a pensamos
na espera? A espera no [deixar] vir não é tal pensamento, e talvez até o
próprio pensar? De acordo com meu inequívoco sentimento, a cura que se abateu
sobre nós repousa não na ocorrência de haver nos libertado de uma necessidade
interna, mas nisto que ela nos transplantou para o saber que nós, enquanto os
que esperam, estamos agora começando a entrar [einzukehren] na ainda-retida essência do nosso povo vencido.
V: Você supõe que,
só na medida em que nos tornarmos àqueles que esperam, nós nos tornamos
alemães?
J: Não o suponho
apenas, eu o sei desde hoje de manhã cedo. Porém, não nos tornaremos alemães enquanto
planejarmos achar “o alemão” através da análise de nossa suposta “natureza”.
Enredados em tais intenções nós apenas caçamos o que é nacional, o qual,
afinal, como diz a palavra, insiste em ser naturalmente dado.
V: Porque você
fala tão severamente contra o que é nacional?
J: Depois do que
dissemos do acontecimento [Ereignis] da
devastação, tem se tornado desnecessário ainda lutar contra o que é nacional.
V: Não compreendo
muito bem isto.
J: A idéia [Idee] de Nação é aquela representação [vorstellung] em cujo campo de visão um
povo se posta a si mesmo, enquanto fundamento dado de algum lugar, constituindo-se
em sujeito, a quem tudo então aparece enquanto o objetivo [Objektive], isto é, à luz de sua subjetividade.
V: A nacionalidade não é nada além da pura
subjetividade de um povo que pretende contar com sua “natureza” enquanto o que
é positivo [das Wirkliche], de onde supostamente
parte todo positivar [Wirken] e sobre
o qual deve retornar.
J: A
subjetividade tem sua essência nisso que o homem, o indivíduo, os grupos, e as
esferas da humanidade, se insurgem para fundar a si sobre si mesmo e afirmar a
si mesmo sobre o fundamento e a medida do que é positivo. Com essa insurreição
na subjetividade emerge a insurreição no trabalho enquanto aquela forma do desempenho
pela qual a devastação da Terra está preparada e finalmente estabelecida ao incondicional. A
única lei da devastação é que o necessário seja o mais necessário e o
unicamente necessário.
V: Com isto, o
nacional então permanece, pois, oficial, onde as Nações se unificam sobre o
internacional.
J: O nacional e o
internacional são o Mesmo. O internacional se fosse genuinamente desdobrado,
seria o que a cordilheira [Gebirge] é
em relação às montanhas singulares [Bergen].
Mas pode a cordilheira levar as montanhas singulares para além delas mesmas?
V: A cordilheira
mantém-se no cume se ela traz para o alto as montanhas singulares juntas em sua
independência própria. Na verdade ela é, em sua forma, algo outro que a soma
das montanhas, e, mesmo assim, ela é apenas o essencial das montanhas.
J: O nacional e o
internacional são tão decididamente o Mesmo, que ambos, na medida em que se nomeiam
pela subjetividade e insistem sobre o positivo, sabem muito pouco – e,
sobretudo, só podem saber muito pouco – o negócio o qual eles movimentam
constantemente.
V: O negócio da
devastação, e isto significa, do trabalho em consideração às possibilidades
aumentadas do trabalho. Desse modo não podemos nos tornar alemães, – o que
significa nos tornarmos quem poeta e pensa, isto é, não podemos nos tornar aqueles
que esperam – enquanto perseguirmos o “alemão” no sentido de algo nacional.
J: Todavia, se
somos o alemão, nós também não nos perdemos num internacionalismo turvo.
V: Visto nos
termos do Nacional e do Internacional, então, não podemos mais dizer o que
propriamente somos.
J: É certamente
desnecessário dizer isto, porque o que é essencial mora mais quieto no não
dito. Por outro lado, podemos saber que, enquanto aqueles que esperam, temos o
mais longo tempo histórico [Geschichtszeit]
à nossa frente.
V: Sabe, parece
como se eu agora também começasse a sentir aquilo que cura. O que você acabou
de dizer, sugere que o existir histórico [geschichtliche
Dasein] de um povo e sua duração não são fundados no fato de que homens
sobrevivem à devastação de seu mero nascimento [Gerburtsart], e vivem, e talvez, como se diz, reconstroem para que
mais uma vez demonstre de forma modificada a vigência do que tem sido até agora.
Antes, a pura duração do Destino torna-se bem-fundada somente através da espera
que espera no vir.
J: Portanto, não
podemos fazer nada de menor que o humilde trabalho de serenamente nos deixar
engajar na espera.
V: E saber
apreender o necessário, no qual em toda parte o desnecessário deve permanecer
ainda.
J: Porque nós
ainda sabemos tão pouco da necessidade do desnecessário [die Notwendigkeit des Unnötigen], que parece como se o
desnecessário fosse rechaçado em um abandono estéril.
V: Você presumivelmente diz deliberadamente:
“parece como se”. Pois na verdade, não é que o desnecessário esteja num estado
de abandono, mas que somos nós – nós que não prestamos atenção ao desnecessário
enquanto o necessário – os abandonados.
J: Você está
certo, e ainda talvez também não. O desnecessário nos requer e a nossa essência
assim como o som, que, mesmo que suma sem ser ouvido, requer o instrumento que
o doa.
V: Então, nós
devemos saber aprender a necessidade do desnecessário e, enquanto aprendizes,
ensinar isso aos povos.
J: E por muito tempo isto talvez seja o único teor
de nosso ensino: o necessário e a necessidade do desnecessário. Agora posso
também te dizer mais claramente o que se tornou dado a conhecer hoje para nós
na cura. É o escuro e o difícil que um tal aprendizado e ensino possam ter
apenas seu o elemento na espera.
V: O que supõe
com isso?
J: O aprender é
espera quando é a procura, e o ensino é espera quando permanece um aconselhar.
V: Todos nós
muito ansiosamente apressamos a procura com o encontrar, e apressamos o
aconselhar com um arrogante querer aviar.
J: Mas não temo a
carga do ensino aprendiz. Sei que há da haver os aparentados que a suportarão
juntos.
V: Em vários
finais de tarde, ao vir pra este campo, nós ponderamos no como aconselhar aqueles entre nós e dentre
ou outros, que apenas sabem do necessário, sobre a necessidade do desnecessário
– e ponderávamos sobre como fazer isto de tal modo que aqueles aconselhados não
caiam no apressado tornar este ensinar numa crença e uma visão de mundo e
exaltá-lo enquanto tal.
J: Não interessa
qual conteúdo elas queiram ensinar, todas as “visões de mundo”, de acordo com
sua essência, pertencem à era e ao domínio da devastação.
V: Esta é uma
corajosa afirmação.
J: O que digo deve parecer sim. O que tenho em
mente poderia se tornar claro para nós por uma recordação sobre a essência do
pensamento moderno.
V: Para isso nós
presumivelmente teríamos que ser ainda mais experimentados no pensamento.
J: E isto significa
agora desde este fim de tarde: nós temos que aprender a esperar.
V: E temos que
tentar dizer para tais amigos o que foi é dado a eles para pensar, por um longo
tempo sempre renovado. Porém nós mesmos devemos primeiramente experienciar e
examinar constantemente o que é inesgotavelmente dado ao homem para pensar.
J: Só assim vem
ao seu aprender e ensinar o que é constante. Todavia, acredito que hoje nós
compartilhamos nossa alegria por muito tempo sobre o que é curador. Amanhã o
puro e simples trabalho estará novamente à nossa frente.
V: Mas como uma
boa noite, e talvez também enquanto um agradecimento, eu ainda gostaria de
relatar a você agora uma curta conversa entre dois pensadores. Nos meus dias de
estudante eu a copiei de uma apresentação historiográfica da filosofia chinesa,
porque isso me atingiu e, contudo, eu não a compreendi naquele tempo. Nesta
noite, pela primeira vez ela se tornou clara para mim, e, provavelmente, por
causa disso essa conversa também me ocorreu. Os nomes dos dois pensadores agora
me escapam.
O diálogo é
assim:
Um diz: “você versa
sobre o desnecessário”
O outro fala: “Primeiro
alguém deve reconhecer o desnecessário antes que se possa lhe falar sobre o
necessário. A Terra é ampla e grande e, contudo, o homem precisa para estar de
pé apenas de espaço bastante para poder sentar seu pé sobre ele. Mas se imediatamente
próximo ao seu pé houvesse uma abertura que fosse até o subterrâneo, então o
espaço sobre o qual ele está de pé seria ainda útil a ele?”
Um fala: “Não seria
mais nada útil a ele”.
O outro fala:
“Disso a necessidade do desnecessário aparece claramente.”
J: Agradeço a
você por este diálogo.
V: E eu a você
por seu poema, no qual talvez afinal algo de coeso esteja oculto.
J: Deixemo-nos
pensando o coeso [das Dichtende].
V. Uma boa noite
para nós dois e todos na tumba.
J: E à pátria, a
bênção de sua determinação.
***
Schloβ Hausen in Donautal, 8 de Maio de
1945.
No dia em que o mundo celebrou sua vitória,
sem ainda reconhecer que já desde
séculos é derrotado por seu
próprio levante rebelde.